Enquanto a
consciência marcial fora do tatame influi ao artista marcial uma conduta
exemplar com abrangência, dentro do tatame a consciência marcial se resume a
postura, percepção e dedicação pessoal.
O praticante de
artes marciais não é simplesmente um atleta. Os treinos não são apenas físicos
com exercícios para condicionar o corpo. Dentro do tatame treinamos o corpo, a
mente e o espírito; as três ferramentas fundamentais para o surgimento de um
artista.
O corpo é uma
ferramenta que será moldada pelos treinos até se tornar uma arma. A mente será
condicionada para se tornar um veículo. O espírito será lapidado pra se tornar
um escudo.
A simbiose
dessas três ferramentas produzirá a consciência marcial do praticante.
Vamos por
partes.
O primeiro ponto
é aprender a compreender as distinções dessas três ferramentas de uma forma
racional para que cada uma delas possa receber as influências corretas do
treinamento sem as distorções de interpretação que a falta de conhecimento
sobre nós mesmos pode causar.
O corpo; parte
física. Carne, músculos, ossos, veias, fluidos e órgãos. Treinar o corpo é
condicionar nosso físico para uma maior resistência, flexibilidade e força,
inserindo e/ou expandindo movimentos com firmeza, segurança e controle.
A mente; parte
inacessível, mas perceptível. É a morada da razão e da consciência, é a
portadora de todos os gatilhos para disparar nossas necessidades físicas e
químicas acionados por nossa vontade e necessidade. Treinar a mente é
racionalizar o que for possível sobre a arte padronizando e referenciando os
comandos específicos de movimentação e aplicação de força.
O espírito;
parte genuína. Não se trata de espiritismo, misticismo ou fantasia. O espírito
é onde estão as características que não são físicas ou químicas.
Características que não são escolhas, mas genuínas do indivíduo. Uma pessoa boa
não é boa por possuir um órgão a mais, ou por ser agraciada com hormônios
diferenciados. Uma pessoa boa é boa por ter um espírito bom. Treinar o espírito
é lapidar a si mesmo purificando as interferências que possam atrapalhar as
influências positivas ou minimizando as influências negativas de nossa própria
natureza. É necessário compreender que por mais racionais que sejamos, ainda
somos animais com impulsos e instintos que precisam ser constantemente
recondicionados à vida em sociedade.
É bastante
comum, e acredito que inclusive é necessário, que muitas vezes nos sentimos
estacionados na arte, com a percepção de que não estamos aprendendo e nos
desenvolvendo mesmo praticando constantemente. Na maioria das vezes que isso
acontece, estamos na verdade confundindo o feedback que a arte nos oferece por
não haver clareza em nossa interpretação sobre que parte de nós está de fato
recebendo conteúdo. Por isso é tão importante compreender que somos o resultado
dessas três instâncias e que a arte irá servir como alimento para as três.
A partir do
momento que compreendemos isso, todos os treinos serão proveitosos e o
desenvolvimento será facilmente perceptível mesmo que não possamos
imediatamente decifrar qual parte de nós deve absorver cada parte do
treinamento. E é aí que a consciência marcial se torna fundamental dentro do
tatame.
Dedicação; essa
é a palavra que deve o mantra do praticante. Dedicar-se aos treinos de forma
plena nos possibilita a absorver as técnicas e fundamentos de forma profunda e
consolidada. Quanto mais o praticante se dedicar à arte, mas a arte irá
corresponder ao artista.
Dedicação plena
é uma escolha consciente!
A dedicação
plena funciona com três "P"s; Prontidão; Precisão; Perseverança. Com
essas três escolhas, iremos determinar nossa própria postura para com a arte.
Iremos nos atentar aos detalhes, estudar os conceitos e tentar compreender o
máximo de informação possível.
Veja bem, não é
algo tão complexo. Aprender significa registrar informação experimentada, é daí
que surge o termo "experiência". Todas as vezes que realizamos uma
ação, nosso cérebro dispara inúmeros neurônios para que tudo aconteça. Se
estamos constantemente repetindo a mesma ação, o cérebro entende que aquela é
uma situação importante e por isso, ao invés de ficar gastando energia
disparando neurônios repetitivos, o cérebro cria sinapses. Quanto mais
consolidada for uma sinapse, mas eficiente seremos, pois iremos realizar tal
ação com economia de energia.
Um exemplo
básico; se você acorda todos os dias no mesmo horário, em algum momento o
despertador não será mais necessário, você irá acordar naquele horário de
qualquer forma.
Então imagine o
seguinte; você treina, treina, treina e treina mais ainda, o que acontece?
Sinapses. Toda informação sobre os treinos se consolida na sua mente. Toda
ação, toda movimentação, toda técnica se torna natural. Eis que a sua
consciência poderá usufruir de um arquivo imenso de possibilidades fluidas. E
se a sua consciência está repleta de sinapses marciais, sua consciência é
marcial.
E qual é a parte
difícil de tudo isso?
Nós mesmos!
Nós temos a
incrível capacidade de nos sabotar. As vezes por insegurança, as vezes por
pessimismo, noutras por vitimismo... Nós sempre estamos diminuindo nossas
próprias capacidades por não acreditar que somos capazes. Esse tipo de situação
surge dentro do tatame por sermos confrontados com outros praticantes de nível
mais elevado. Jamais devemos nos comparar. Acredite, por mais graduado que seja
um praticante, ele não nasceu cheio de habilidades marciais. Todo artista
marcial começou com uma faixa branca na cintura. Tudo não passa de uma questão
de tempo de treino. Não se compre, se inspire.
Crie e consolide
sua própria consciência marcial.
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